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domingo, 6 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26658: Convívios (1017): 61º almoço-convívio da Magnífica Tabanca da Linha, em Algés, dia 29 de maio, quinta, com a presença dos nova-iorquinos Vilma e João Crisóstomo (Manuel Resende, réguçlo)




1. Postagem do Manuel Resende na página do Facebook da Magnífica Tabanca da Linha, com data de anteontem, 4 de abril, 22:49:

 

Manuel Resende, o magnífico régulo


Caros Magníficos, Convidados e Amigos, no próximo dia 29 de Maio será o próximo Convívio da Magnífica Tabanca da Linha. Este convívio será o nosso nº 61. (Esteve previsto para dia 31, mas foi alterado, não fazemos ao sábado.)

Espero que seja bem concorrido. Vem estar presente o nosso Magnífico e Camarada João Crisóstomo  e a sua esposa Vilma, que vêm de Nova Iorque, além de outros possíveis novos camaradas convidados por ele.

Não podemos deixar de estar presentes para conviver com este Camarada Crisóstomo, que tanto fez e faz para que o nome de Portugal seja conhecido no mundo. vejam a sua História.

Peço aos Camaradas da CCAÇ 2585, a minha Companhia, e que são Magníficos, para estarem presentes. Seria dois em um. Contactar-vos-ei a todos.

Abraço para todos os Magníficos.

Manuel Resende.


Vilma e João, Nova Iorque, 2013... "Just married"


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Guiné 61/74 - P26657: VI Viagem a Timor Leste: 2025 (Rui Chamusco, ASTIL) - Parte III: 22 de março, um dia histórico para a Escola de São Francisco de Assis, com a visita-surpresa de Kay Rala Xanana, o 1º ministro de Timor Leste




Timor Leste > Município de Liquiçá > 22 de março de 2025 > Não foi "a preciso a montanha ir a Maomé"... Desta vez, foi "Maomé que foi à monhanha"...






O 1º ministro da República Democrática de Timor-Leste (RDTL), Kay Rala Xanana Gusmão faz uma visita-surpresa â Escola de São Franscisco de Assis (ESFA), em Boebau, Manati, suco de Leotela, município de Liquiçá, na festa da celebração do 7º aniversário da sua fundação.

 E deixa uma mensagem de esperança com vista à resolução dos problemas pendentes (o mais grave, a falta de professores diplomados, fornecidos e pagos pelo governo da RDTL: ao fim de 7 anos, continua a funcionar com 5 professores voluntários, sem as habilitações exigidas por lei; a escola, privada,construida por iniciativa da ASTIL - Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste, sediada em Coimbra, Portugal,   é frequentada por 102 alunos, 54 meninas e 48 rapazes, que vivem no suco de Leotela, sem acesso à esc0la pública. (Mesmo em Timor Loro Sa'e, a terra do sol nascente, em tétum, o sol quando nasce ainda não é para todos...)

Créditos fotográficos: Média - GPM / RDTL (República Democrática de Timor-Leste, com a devida vénia)... Fonte: Página do Facebook do 1º Ministro da RDTL, Kay Rala Xanana Gusmão



1. O  Rui Chamusco  é membro da nossa Tabanca Grande desde 10 de maio de 2024. Tem 78 anos, é natural da Malcata, Sabugal, vive na Lourinhã onde durante cerca de 4 décadas foi professor de música no ensino secundário. Está reformado, mas ativo e proativo.

 É um dos cofundadores e dirigentes da ASTIL (Associação dos Amigos Solidários com Timor-Leste), pensada em 2015, criada legalmente em 2017, com sede em Coimbra, com outros amigos, o luso-timorense Gaspar Sobral e a malcatense Glória Sobral. É uma instituição privada de solidariedade social sem fins lucrativos.

Esta é  uma grande história de amizade e solidariedade. Com esta, é a sexta vez  que o "avô" Rui viaja até Timor, desde 2016. Em geral, fica lá no mínimo 3 meses,  dedicando-se de alma e coração aos projetos que a ASTIL tem lá desenvolvido, nas montanhas de Liquiçá, onde estão as raízes da família Moniz Sobral, e nomeadamente a Escola de São Francisco de Assis (ESFA), em Manati / Boebau, suco de Leotala, município de Liquiçá, que no dia 19 de março de 2025 celebrou o seu 7º aniversário. (Mas a festa só foi no sábado, dia 22.)

Em Dili ele costuma ficar em Ailok Laran, bairro dos arredores, na casa do Eustáquio (alcunha do João Moniz Sobral) , irmão (mais novo) do Gaspar Sobral. É tratado como avô, tio ou pai. Ou malae (branco) e agora, mais recentemente, por katuas (velhote), à medida que os 78 anos começam a pesar. Mas, claro, ninguém lhos dá... em Portugal. Em Timor, um país extremamente jovem, quem vai para os 80 é um katuas (velhote, mas respeitado).



VI Viagem a Timor Leste: 2025 (Rui Chamusco, ASTIL) - Parte III: 22 de março, um dia histórico para a Escola de São Francisco de Assiz, com a visita-surpresa de  Kay Rala Xanana, o 1º ministro de Timor Leste 



21.03.2025, sexta  – Preparando o VII aniversário da ESFA

Confesso que sinto algum desânimo e deceção. Todos os convites formulados e entregues a pessoas e entidades não tivemos qualquer resposta. Algumas pessoas e amigos com quem contávamos, à última da hora, não puderam participar. Das cartas enviadas ao senhor Primeiro Ministro Xanana Gusmão e ao senhor vice-primeiro Ministro Assanami Sabino também não houve resposta. 

Foi então que disse para o Eustáquio: “Não faz mal. Vamos celebrar o aniversário entre nós (professores, alunos, famílias)”. E elaborei um pequeno programa para o efeito, simples mas bonito, que a seguir apresento.

ESCOLA SÃO FRANCISCO DE ASSIS “PAZ E BEM” 
– Boebau / Manati – Leotalá

VII aniversário

1. Boas vindas

- Eustáquio
- Hino da Escola

2. Imposição de tais

3. Celebração:

- Cântico “Vamos aclamar o Senhor”

- Cântico das criaturas

- Música “Amazing Grace” com leitura da Oração de S.Francisco

- Cântico “Nós damos graças ao Senhor”

4. Inauguração do muro de proteção

- Leitura do poema “O Muro” de Alberto Oliveira

- Música de acordeão e canas, paus, pedras

5. Canções portuguesas:

- “A Chuva” )

- “A dar-te um beijo” ) Adobe

- Abre a janela /As modinhas / É bom camarada

6. Parabéns a você

- Canto dos Parabéns


- Corte e distribuição do bolo e do champanhe

7. Almoço para crianças e adultos

8. Visita às instalações da escola e casa dos professores


Depois de um pequeno ensaio com a Adobe e o Eustáquio, achamos que já estávamos preparados para o dia seguinte. Toca a descansar…”Vamos a la cama que hay que descansar / Para que mañana podamos trabajar” (canção espanhola para as crianças irem para a cama).

22.03.2025,  sábado – VII aniversário da ESFA


De manhã cedinho, toca a levantar para que a hora marcada iniciemos a viagem até Boebau que, como sempre, será uma aventura no bom e no mau sentido: caminhos difíceis em que tanto veículos como pessoas têm de andar aos saltos, e onde nós os mais velhos,  katuas,  ficamos feitos num oito, todos escangalhados, mas também paisagens muito bonitas, com pessoas amáveis que nos dão o “bom dia!"... 

 nossa chegada já se ouviam as crianças da SFA cantando, sob o comando de Titânia, uma nossa antiga aluna que agora frequenta a escola CAFE de Liquiçá. Logo que descemos as escadas, toda aquela gente corre para nós para o ritual do “beija mão”, ou outros cumprimentos mais ocidentais. 

Mais ou menos à hora prevista, começou a realização do programa, que não foi cumprido na íntegra porque, a um determinado momento, começou a avistar-se um carro da polícia, seguido de mais seis carros de Estado. E, num grito, alguém anunciou: “Xanana!...Xanana!"... 

Foi um autêntico reboliço que se gerou. Programa interrompido, para ir receber o Sr. Primeiro Ministro e todo o seu séquito. Ao som de palmas e de aclamações, eu e o Eustáquio fomos ao seu encontro, e depois de uma saudação efusiva, perguntei: “Porque não nos respondeu?”. E ele respondeu: “Quis fazer-vos uma... surpresa!”

E pronto, a partir daqui o programa teve que ser alterado mas não na totalidade. Continuamos a pequena cerimónia, agora com a presença de altas individualidades e do povo de Boebau que ao saber da presença do Kay Rala Xanana se aglomerou na escola e nas redondezas.

Ficamos muito bem impressionados com a simplicidade, a empatia e a capacidade desta personagem emblemática para Timor Leste e para o mundo. O sr. Primeiro ministro falou e disse coisas importantes, cantou e orientou a cantoria, distribuiu comida às crianças, tirou fotografias com quem solicitou, etc…

 Embora já tivéssemos um bolo de aniversário, ele preocupou-se de trazer um bolo de aniversário enorme, bonito, aonde podemos ler “ Escola S. FRANCISCO DE ASSIS “ Paz e Bem”/ VII aniversário / 22 de Março de 2025”, e que depois cortou e partilhou pelas crianças e adultos. 

Trouxeram também carregamento de sacos de arroz, caixas de supramin, caixas com garrafas de óleo, livros para as crianças e caixas com camisolas (t-shirt), que oportunamente serão distribuídos pelas famílias mais carenciadas.

Depois do almoço para adultos e crianças, e depois de uma prolongada sessão de fotografias, chegou a hora da partida. Todos agradecemos esta agradável surpresa e, ao som de palmas e de agradecimentos, o senhor Primeiro Ministro e seus acompanhantes procederam à retirada, até porque tinham ainda de marcar presença noutro evento. 

Dia memorável em Boebau. Dia memorável para a ESFA. Diz-se por cá, que este dia vai ficar para sempre, e que há dois acontecimentos que ficam na história de Boebau, a saber: a inauguração da Escola São Francisco de Assis e a visita do Senhor Primeiro Ministro Kay Rala Xanana Gusmão.

E assim o VII aniversário da ESFA se tornou num facto histórico. Imaginam com certeza o nosso inebriamento, a nossa alegria, a nossa satisfação. A visita do Sr. Primeiro Ministro foi muito importante, que muito agradecemos. Mas não é de menor importância a sensibilidade

Assim, e a pedido dele, estamos a preparar um pequeno portefólio sobre a escola, de modo a ser-lhe entregue durante estes oito dias. Depois veremos. Mas temos esperança que, desta vez, ou “vai ou racha”, porque há pessoas em lugares de chefia que podem tomar essa decisão.

“Sursum corda!” (Corações ao alto!)

22.03.2025 – A seguir…

Embora extenuados pelo cansaço corporal e pelas fortes emoções, tivemos de pensar também no regresso a Dili. Mas a chuva era tanta e o nevoeiro tão intenso que não ousamos fazer a viagem. Não valia a pena arriscar. Tivemos então que decidir pernoitar em Boebau, para amanhã regressar à capital. 

E vai daí, tivemos tempo para tudo: para entregar as prendas e os donativos dos padrinhos, para em amena cavaqueira bebermos o café timorense, e para mais uma vez. sermos “instrumentos de paz”. Já não é a primeira vez que sou chamado para
exercer tal função perante situações conflituosas, às vezes até muito violentas. Talvez porque sou katuas e malai,  e porque sou associado à figura de São Francisco de Assis e à escola “Paz e Bem”, todos têm um grande respeito e carinho por mim. O grande interlocutor destas situações é sempre o Eustáquio que me disse” Tiu, temos de ir a casa de… para falar com… e para ele(a) perdoar e fazerem as pazes”. 

Missão cumprida. Fizemos o que devíamos, e o resto cabe a Deus. Mas, parece que deu resultado. À noite, na casa para os professores, cada um procurou o seu canto para poder descansar.

23.03.2025, domingo – O regresso à base

Logo de manhã, porque temíamos que a chuva e o nevoeiro nos boicotassem o caminho, aí vamos nós. Nada de relevante, a não ser os buracos e a lama (manteiga) em alguns troços do caminho, o leito da ribeira que não tem dez metros que sejam direitos, a boa estrada de Liquiçá a Dili e, para a gente não se habituar, o calvário dos caminhos (mercado de Perunas e seguintes) que nos trazem até aqui, em Ailok Laran. 

Normalmente, seja na ida ou na vinda, fazemos uma paragem antes da descida para qualquer direção, a fim de arrefecer o motor da pickup e dos fumadores engolirem o fumo de dois ou três cigarros. 

O local da paragem é um sítio lindíssimo, donde se avistam paisagens maravilhosas aonde predominam árvores de grande porte (20 a 30 metros de altura, com uma copa a condizer) – a madre cacau – que abriga os cafeeiros. Ouve-se um som muito intenso que é produzido pela grande quantidade de cigarras que povoam a copa destas árvores. 

Foi então que o Eustáquio me saiu com esta: “Quando eu era garoto, à noite acendíamos uma fogueira, e as cigarras atraídas pelo fogo caíam em cima do lume, ficavam assadas e a gente comia”. 

Ora aqui está mais uma descoberta, mais um grande petisco. Mas não as comeram todas, como se pode verificar pelo som atordoador que ouvimos. Dó que, se a moda pega, não há cigarra que resista, e teremos mais uma espécie em vias de extinção.

25.03.2025, terça – Carta de Agradecimento


Hoje fomos entregar no Palácio do Governo, Gabinete do Sr. Primeiro Ministro a carta de agradecimento pela visita surpresa que nos fez, assinada por mim e pelo Eustáquio, em nome da ASTIL de Portugal e da ASTILMB de Timor Leste, em nome das crianças e adultos da Escola São Francisco de Assis, em nome do povo de Boebau. 

Jà ontem tivemos uma reunião de trabalho com o amigo Rui Pacheco, técnico do governo na área de apresentação de projetos, que se disponibilizou para elaborar um pequeno dossiê sobre a ESFA, a fim de ser entregue ao primeiro ministro Xanana Gusmão e ao vice primeiro ministro Assanami Sabino, que eles próprios me solicitaram. 
 
O Ministro Ray Kala Xanana pediu-me em Boebau para lhe fazer chegar esse relatório nos próximos oito dias. Tudo faremos para que assim seja. E esperamos com alguma ansiedade que nos façam chegar decisões que sejam a solução para os problemas que enfrentamos.

Sua Excelência
Kay Rala Xanana Gusmão
Primeiro Ministro da República Democrática de Timor Leste

Com os nossos melhores cumprimentos, vimos agradecer a Vossa Excelência a visita surpresa que nos fez por ocasião da celebração do VII aniversário da Escola São Francisco de Assis “Paz e Bem”, em Boebau, nas montanhas de Liquiçá, suco de Leotalá. A presença de Vossa Excelência, bem como de todas as pessoas que o acompanharam, foi para todos nós motivo de honra e satisfação, que deu a esta escola projeção ímpar tanto em Timor Leste como noutras partes do mundo, sobretudo no país irmão Portugal. 

Apreciamos muito a sua simplicidade e a sua empatia com as crianças e adultos presentes, e vamos guardar bem nos nossos corações e nas nossas memórias este dia extraordinário da visita do Sr. Primeiro Ministro Kay Rala Xanana, personagem muito querida e respeitada por esta gente das montanhas. 

Dia 22 de março de 2025 fez-se história em Boebau, fez-se história na Escola São Francisco de Assis “Paz e Bem”

MUITO OBRIGADO SENHOR PRIMEIRO MINISTRO, em meu nome pessoal (abô Rui), em nome do Coordenador da ESFA (Pai Nino), em nome da Escola São Francisco de Assis(ESFA), em nome da Associação de Amigos de Timor Leste de Portugal (ASTIL) eda Associação de Amigos de Timor Leste de Manati/Boebau (ASTILMB), em nome de todas as crianças e pessoas de Boebau e localidades mais próximas.

Queremos também manifestar a nossa disponibilidade para colaborar, segundo as nossas possibilidades, na educação e desenvolvimento deste país irmão, ao qual estamos intensamente ligados por laços culturais e de amizade. Timor Leste, e particularmente as crianças mais necessitadas das montanhas e dos bairros mais pobres de Dili, estão no nosso coração. Que São Francisco de Assis a todos nos abençoe…

Com muita estima e consideração

Professor Rui Chamusco / Coordenador João Moniz Sobral


27.03.2025, quinta– A Elisa


A menina Elisa é a filha mais nova de 14 irmãos da família Vitor, veterano da resistência de quem muito tenha falado nas minhas primeiras crónicas. A Elisa já não conheceu o pai porque ele faleceu antes ou pouco tempo depois de ela nascer. Devido à situação degradante em que esta família vivia – um verdadeiro caso social –
tentamos logo resolver alguns problemas, através da angariação de meios económicos que permitissem a construção de uma casa digna para habitação. Conseguimos também que quatro dos seus filhos fossem apadrinhados por sócios da Astil. E foi sempre nossa preocupação que as crianças em idade escolar frequentassem a escola.

Este ano, logo quase no início da minha estadia, os padrinhos da Elisa enviaram um donativo bastante generoso, e por isso a Elisa foi convocada (eles habitam aqui em Ailok Laran) para vir receber o donativo. E a menina(já vai a fazer 9 anos no mês de Junho) apareceu ao final da tarde. Limpinha e bem vestida(creio que o vestido foi alugado para a ocasião). E, perante a pergunta que lhe fiz “em que classe andas na escola?”, a Elisa, triste, respondeu: “Eu não vou à escola”. Parece que explodiu em mim uma bomba. “O quê? Esta menina não anda na escola? Então não se entrega o donativo enquanto este assunto não for esclarecido e resolvido.” E lá fui eu e o
Eustáquio a casa da família Vítor, ver o que se passava. O irmão mais velho, José, explicou então que a Elisa ainda não foi matriculada na escola porque não tem a certidão de batismo. Em Timor Leste, a certidão do batismo é um documento oficial, que substitui a certidão. E não vale a pena fazer mais perguntas, porque todas as respostas que nos possam dar não conseguirão justificar a negligência desta gente.

Ainda lhes disse que, se isto fosse em Portugal era a polícia que vinha ter com eles, porque é um crime privar uma criança de frequentar a escola. “Então nós (eu e o Eustáquio) vamos tratar disto”. E lá fomos nós ao Cartório Paroquial da Sé tentar obter
a certidão de batismo. Foi uma trabalheira, porque os nomes não batiam certos. Nós pensávamos que a filiação era o pai e a mãe que tods conhecemos, mas afinal, o José e a Rita (o irmão e a cunhada) perfilharam a menina que já foi batizada depois de o verdaeiro pai morrer. Ao fim de alguns dias ou semanas lá conseguimos a dita certidão que nos vai permitir deslocarmo-nos até uma escola das redondezas para matricularmos para matricular a Elisa.

28.03.2025, sexta – A matrícula da Elisa

Logo de manhã, a Marcelina (Akai) telefona ao Eustáquio para dizer que espera por nós às 10 horas para ir connosco à Escola de Hudi Laran falar com o diretor sobre a matrícula. Passamos pela casa do Vítor para apanhar a Elisa, que depois de algum tempo de espera porque tinha de se preparar, lá vem a menina. Enquanto esperávamos, algo nos chamou a atenção. Primeiro o filho Valente, que nós ajudamos a reintegrar na escola há alguns anos mas sem grande êxito porque só estudou até ao nono ano.

Educadamente veio cumprimentar-me, e depois tentou disfarçar ou encobrir o que se estava a passar. Junto a ele estava um grupo de jovens, alguns já casados e com filhos, bêbados que nem um cacho, alguns já na ressaca e sem saberem o que diziam ou faziam. Tinham junto deles um garrafão de 5 litros de sabu. Uma bebida alcoólica extraída das palmeiras parecida com a aguardente. Começaram a beber ontem à noite e esta manhã ainda tinham lá uma pinguinha. Hoje é para a ressaca, também ela cheia de peripécias que nem vale a pena contar. 

“O timorense é assim. Tem dinheiro e gasta logo em cigarros e sabu”, diz o Eustáquio. É pena que assim seja. Há tanta coisa a emendar por aqui!... 

Mas vamos ao que interessa. Chegados à escola, fomos recebidos pelo diretor que logo nos disse: ”Agora já é tarde para fazer a matrícula porque os dados desta escola já foram enviados para o ministério da educação". 

Então pedimos que a Elisa, mesmo sem estar matriculada, pudesse informalmente ir a esta escola para conviver e assistir às aulas e para o começar logo no início. O diretor aceitou, e ficou de falar com uma das professoras. 

E assim a Elisa, na próxima segunda feira já pode ir à escola. Depois, lá fomos nós comprar duas fardas, meias e sapatos, mochila e material escolar para que a Elisa se sinta integrada neste novo mundo, no seu ambiente escolar. Que este seja o princípio de uma nova vida…


(Revisão / fixação de texto para publicação no blogue: LG)
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Notas do editor:

(**) Vd. postes de:

30 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26630: Facebook...ando (70): Timor-Leste: 1º ministro Kay Rala Xanana Gusmão faz visita surpresa à ESFA - Escola São Francisco de Assis, nas montanhas de Liquiçá, em 22 de março - Parte I

31 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26631: Facebook...ando (71): Timor-Leste: 1º ministro Kay Rala Xanana Gusmão faz visita surpresa à ESFA - Escola São Francisco de Assis, nas montanhas de Liquiçá, em 22 de março - Parte II

Guiné 61/74 - P26656: Parabéns a você (2364): Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Especiais da CART 3492; Pel Caç Nat 52 e CCAÇ 15 (Xitole, Mato Cão e Mansoa, 1971/73)

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Nota do editor

Último post da série de 4 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26649: Parabéns a você (2363): Agostinho Gaspar, ex-1.º Cabo Mecânico Auto da 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72 (Mansoa, 1972/74)

sábado, 5 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26655: Os nossos seres, saberes e lazeres (676): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (199): O Museu de Cerâmica das Caldas da Rainha, este meu ilustre desconhecido – 1 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Novembro de 2024:

Queridos amigos,
Que bela surpresa, tantas vezes visitei as Caldas da Rainha na completa ignorância de que havia este fabuloso museu à minha espera. Aqui fica a advertência para quem visitar as Caldas, é destino irrecusável, os tesouros cerâmicos são mais do que primeira classe. Deve haver ali uma grande falta de dinheiro para a manutenção dos parques e há degradações no interior do edifício, é pena porque todo aquele ambiente tardo-romântico, se for bem preservado, tem todo o direito de ser apresentado pelo turismo como uma grande casa de cultura. E temos que agradecer ao visconde de Sacavém este fenomenal legado, ainda bem que ele possuía um gosto eclético tão apurado; e as coleções ligadas à Fábrica Rafael Bordalo Pinheiro são magníficas, deixam-nos embasbacados. Pois bem, a visita vai continuar.

Um abraço do
Mário


Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (199):
O Museu de Cerâmica das Caldas da Rainha, este meu ilustre desconhecido – 1


Mário Beja Santos

Para ser sincero, das muitas vezes que passei pelas Caldas da Rainha, e durante anos os meus padrinhos ofereceram período de férias na Foz do Arelho, o que havia a visitar na cidade era o parque, o Museu José Malhoa, naquele tempo funcionava a Fábrica da Secla, era um prazer ir ver aquelas belas peças, muitas delas únicas, desenhadas por uma húngara que ali trabalhou, Hansi Staël, e inevitavelmente entrar na Igreja de Nossa Senhora do Pópulo. Ora, em 1983, abriu ao público o Museu de Cerâmica de que eu nunca ouvi falar. Há uns tempos, visitando a loja da Fábrica Bordallo Pinheiro, veio à conversa um comentário sobre os tesouros ali existentes, curioso, perguntei onde era o museu, é só subir até o Avenal, encontrará facilmente uma velha moradia numa área em que há centro de artes. E lá fui, bem me regalei, como passo a contar. Sobre a história deste museu vale a pena citar alguns parágrafos do que vem no site oficial deste templo da cerâmica:
“Encontra-se instalado no antigo Palacete do Visconde de Sacavém, no Avenal, mandado construir na década de 1890 pelo 2.º Visconde de Sacavém, José Joaquim Pinto da Silva (1863-1928), colecionador, ceramista e importante mecenas dos cerâmicos caldenses.
Encontra-se rodeado por jardins com alamedas, canteiros, floreiras, lagos e um auditório ao ar livre, sendo de realçar a decoração profusa que ornamenta todo o conjunto e inclui azulejos do século XVI ao século XX, elementos arquitetónicos cerâmicos e estatuária.
O acervo do Museu integra diversas coleções representativas da produção das Caldas da Rainha e de outros centros cerâmicos do país e do estrangeiro. As coleções compreendem peças da cerâmica antiga caldense dos séculos XVII e XVIII e núcleos da produção do século XIX e primeira metade do século XX. São de salientar os trabalhos da barrista Maria dos Cacos, autora de peças utilitárias antropomórficas, e de Manuel Mafra.

Merece um especial destaque o núcleo de obras da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro, um dos conjuntos mais representativos da produção do grande mestre da cerâmica caldense e que documenta a intensa laboração da Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha, entre 1884 e 1905. Apresentam-se também núcleos de faianças da Real Fábrica do Rato, de olaria tradicional e de produção local de escultura e miniatura dos séculos XIX e XX.
Destaca-se, um núcleo de cerâmica contemporânea de autor, que inclui, entre outros, peças de Llorens Artigas, de Júlio Pomar e de Manuel Cargaleiro. O Museu possui ainda uma coleção de azulejaria que integra produção portuguesa, hispano-mourisca e holandesa do século XVI ao século XX, constituída por cerca de 1200 azulejos e 40 painéis.
O Museu apresenta ainda uma coleção de 40 peças contemporâneas, ilustrativas de design e produção de cerâmica e vidro do século XX, que fazem parte de uma doação feita em 2007, constituída por 1205 peças.”




Imagens da entrada principal do edifício e das suas traseiras
O maravilhamento azulejar começa logo à entrada, haverá esplendorosa cerâmica em toda o palacete do 2.º Visconde de Sacavém
Uma das maravilhas do azulejo do século XVIII, pois então
Placa comemorativa do palacete do visconde de Sacavém
Um outro olhar sobre o palacete
É indesmentível que o senhor visconde tinha muito bom gosto e uma boa museografia faz o resto
Esta composição do Adamastor acompanha as ilustrações de Os Lusíadas, há gente assombrada e aterrada com o gigante, Vasco da Gama está firme, vai mesmo passar o Cabo das Tormentas.
Eu guardo lembrança deste Rafael Bordalo Pinheiro no museu do seu nome, ali no fim do Campo Grande, onde um conjunto de amigos reuniu numa moradia exemplares do seu génio. Um dia, numa entrevista, perguntaram à Paula Rego qual fora o maior artista plástico do século XIX, ela respondeu sem qualquer hesitação: Rafael Bordalo Pinheiro.
Gosto da ousadia do museógrafo que é capaz de transformar um recanto de uma cozinha num espaço de fascínio, uma iluminação perfeita, uma boa adequação de objetos, um passado renovado, com sensibilidade e inteligência.
Escultura de Nossa Senhora com o Menino, autor desconhecido, século XVII
Não há lambril do palacete que não esteja revestido, achei de enorme beleza estes três cavaleiros, parece que estão a pousar para nos impressionar com a sua arte equestre
O mínimo que se pode dizer desta bela fonte bordaliana é que é uma maravilha
A orelha faz parte da tradição da cerâmica caldense e a legenda é uma séria advertência para pessoas que andam descuidadamente a fazer comentários em voz alta: as paredes têm ouvidos.
Painel de Azulejos, Querubins, Fábrica de Faianças das Caldas da Rainha

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 29 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26627: Os nossos seres, saberes e lazeres (675): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (198): Bruscamente, no Natal passado, uma viagem relâmpago a Ponta Delgada – 2 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P26654: (De)Caras (229): Mais postais ilustrados da coleção do Agostinho Gaspar (ex-1.º cabo mec auto, 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74), que ontem fez 75 anos, três quartos de século

 

Guiné > Bissau > s/d  (c. 1960/70) >  "Banho de menino (Fulacunda)". Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 140". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal. Imprimarte, SARL).

Guiné > Bissau > s/d  (c. 1960/70) > "Fulas batendo pano (Bissau)". Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 114". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal. Imprimarte, SARL).

Guiné > Bissau > s/d  (c. 1960/70) > "Mercado nativo (Bissau). Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 103". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal). Imprimarte, SARL.


Guiné > Bissau > s/d  (c. 1960/70) >   "Nova Lamego, Guiné Portugesa".  Colecção "Guiné Portuguesa, (s/n) ". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal,  Imprimarte, SARL).

Guiné > Bissau >  s/d (c. 1960/70) > "Bafatá".  Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 136". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal). Imprimarte, SARL.

De cima para baixo, edifício da administração de Bafatá (circunscrição) (as duas primeiras imagens); o mercado (3ª); a mesquita (4ª); a catedral (católica) (5ª); vista aérea (6ª); postal ilustrado nº 136, da edição Foto Serra.

Guiné > Bissau >  s/d (c. 1960) > Aeroporto Craveiro Lopes. Bilhete Postal, Colecção "Guiné Portuguesa, 121". (Edição Foto Serra, C.P. 239 Bissau. Impresso em Portugal,  Imprimarte, SARL).  

Coleção: Agostinho Gaspar / Digitalizações, edição e legendagem: Luís Graça & Camaradas da Guiné (2010).


1. Continuação da publicação de uma seleção dos postais ilustrados da Guiné do
nosso tempo (c. 1960/70),  da coleção do nosso camarada, natural do concelho de Leiria, Agostinho Gaspar (ex-1.º Cabo Mec Auto Rodas, 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612/72, Mansoa, 1972/74). 
O pretexto foram os seus 75 anos (*).

Para além da Foto Serra, havia outros editores de postais ilustrados:

  • Agência-Geral do Ultramar.
  • Casa Mendes (com destaque para o fotógrafo A. B. Geraldo);
  • Casa Gouveia;
  • Foto Íris, etc-

 2. Comentário do editor LG:

Aproveita-se a oportunidade para pedir aos nossos camaradas o envio de cópias digitalizadas, com boa resolução, dos postais dos seus álbuns, que eventualmente ainda tenham guardados no "baú da Guiné"... Imagens e respetivas legendas, por favor (como as que acima reproduzimos)...

É uma pena que estes postais se percam, dado o seu valor iconográfico e documental.  Mais: é "pecado" estes postais irem para o lixo... E um "crime" de lesa-memória, lesa-património...

Digam lá se não é um ternura aquele primeiro postal que publicamos, a de uma mãe (biafada ?), em Fulacunda, a dar o banho ao seu menino numa cabaça cortada ao meio ?!... Claro   que o Facebook não mo deixa publicar, a esta hora já removeu o "conteúdo por  nudez e atividade sexual" (!)...

Pergunto: amigos e camaradas, o que é feito deles, desses postais ilustrados, com motivos do folclore local ou paisagens da Guiné, que comprávamos em Bafatá, Nova Lamego, Teixeira Pinto ou em Bissau, como lembranças ou como  bilhetes de correio que, depois de devidamente selados, mandávamos para a família, vizinhos, colegas  e amigos, com uma simples nota a dizer que "estávamos de boa saúde mas cheios de saudades"?!..

Muitos terão acabado, ingloriamente, no caixote do lixo, tal como os nossos aerogramas e cartas. Outros, compram-se agora por aí, em alfarrabistas e antiquários, procurados por coleccionadores de postais, saudosistas da Guiné, da África, do Império, ou apenas por simples coleccionadores... Outros ainda pairam no fundo dos nossos baús... Quantos, onde ?...

Bom, no último caso, é altura de lá ir tirar-lhes o pó, digitalizá-los e mandar-nos a respectiva imagem, para publicação no blogue, se possível com a reprodução dos respectivos dizeres... 

No caso de o bilhete postal (ilustrado) ter alguma mensagem escrita que possa ter interesse para o nosso blogue, para o conhecimento e a compreensão do nosso quotidiano de guerra, ou até para a divulgação da história e da cultura dos povos da Guiné-Bissau, peço para me tirarem também uma cópia...

Para alguns de nós, estes postais podem ter algum valor afectivo, sentimental, raramente estético... Noutros casos, eles podem ter interesse, documental, para os estudiosos da Guiné e da guerra colonial: sociólogos, antropólogos, historiadores... Terão seguramente algum interesse para os mais jovens, portugueses e guineenses, com pouca ou nenhuma informação sobre os seus países, de há 50/60 anos atrás...

Não vale a pena também esconder que muitos deles eram um arma de propaganda, usada pelo regime político de então, para reforçar a ideia do Portugal plurirracial e pluricontinental, que ia supostamente do Minho a Timor...  Têm valor também por isso. Sobvretudo, fazem parte da nossa história, a grande e a pequena.


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sexta-feira, 4 de abril de 2025

Guiné 61/74 - P26653: (In)citações (264): Morreu Roberta Flack aos 88 anos, a mesma Roberta Flack que acompanhava as noites do medo no mato da Guiné... (Ramiro Figueira, ex-Alf Mil Op Especiais)

1. Em mensagem do dia 3 de Abril de 2025, o nosso camarada Ramiro Figueira, médico na situação de reforma, que foi Alf Mil Op Especiais na 2.ª CART/BART 6520/72 (Nova Sintra, 1972/74), enviou-nos esta reflexão motivada pela notícia da morte da cantora norte-americana Roberta Flack (1937-20225):

Ouvi agora na rádio. Morreu Roberta Flack aos 88 anos, a mesma Roberta Flack que acompanhava as noites do medo no mato da Guiné, acompanhava as cervejas mais ou menos frescas, acompanhava as piadas de gosto duvidoso, os risos nervosos, as corridas para os abrigos e a gritaria na noite escura.

Vinha a guiar tranquilamente quando o locutor com voz impessoal me comunicou que, a cantora morrera. Encostei o carro e fiquei a ouvir aquela voz suave “Strumming my pain with his fingers…” e veio tudo de repente ao meu encontro. O tipo que disparava sofregamente granadas de morteiro, o outro acocorado por baixo da mesa da messe a tremer, o bêbado caído no chão por baixo dos bancos feitos de pipas, a gritaria ao longe nas valas, os rebentamentos sucessivos por todo o lado e… de repente o silêncio, só ela continuava a cantar “Singing my life with his words…” Aqueles homens suados de tronco nu e olhos arregalados furando a noite à procura de alguma coisa para lá do arame. Mas… homens? Não eram, era sim um bando de garotos assustados que as teias que o império tece tinham arrancado da família, das suas vidas e decepado a sua juventude.

Agora tudo isso já lá vai, passaram-se muitos anos e o tempo foi-se encarregando de esbater as memórias e nas gerações mais novas são estórias que os velhos contam (os que contam…). Coisas de velhos, sim talvez, mas devagarinho, pé ante pé, começa a desenhar-se o que poderá ser coisa de novos. Ventos agrestes sopram por aí, as cores do céu no horizonte variam entre o cinzento e o negro e os tecelões do império já estão a trabalhar… Talvez, quem sabe, irão as novas gerações atirar-se ao chão ao som de explosões e tiroteio enquanto a Roberta Flack vai cantando:

“Telling my whole life with his words”



“Killing me softly with his song"

RF 2025.02.24
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Nota do editor

Último post da série de 10 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26569: (In)citações (263): Palavras de homenagem e de agradecimento da família do Valdemar Queiroz da Silva (1945-2025): "Perdi um pai mas encontrei muitos tios! (José da Silva) | "Pai, como você diria de uma forma muito teatral, no final de uma boa garrafa de vinho: Deste..? Deste já não há mais! " (Maaike da Silva)

Guiné 61/74 - P26652: Recortes de imprensa (144): GNR põe fim a 20 anos de falsos peditórios dos bombeiros. Publicação do Jornal de Notícias (JN) do passado dia 3 de Abril de 2025, que aqui reproduzimos com a devida vénia

RECORTES DE IMPRENSA

Com a devida vénia ao JN, reproduzimos uma notícia publicada neste diário no dia 3 de Abril de 2025, que é do interesse geral e particularmente de todos os Antigos Combatentes.

GNR põe fim a 20 anos de falsos peditórios dos bombeiros

Bilhetes para sorteio da Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra foram vendidos em falsos peditórios

Roberto Bessa Moreira
Jornalista


Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra é suspeita de dar cobertura à burla e foi alvo de buscas.

Um grupo hierarquizado e com várias células acumulou muitos milhares de euros, nos últimos 20 anos, com falsos peditórios para os bombeiros. O esquema estendeu-se a todo o país e, suspeita a investigação da GNR, terá tido a cobertura da Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra. Esta instituição foi alvo de buscas ontem, no âmbito da Operação “The Scheme”, que levou os militares a Braga, Moimenta da Beira, Loures ou Pombal. No final, oito pessoas e duas entidades foram constituídas arguidas por burla, branqueamento de capitais e associação criminosa.

O esquema era simples. Um grupo de três ou quatro pessoas instalava-se junto a semáforos, cruzamentos ou rotundas de diferentes cidades e abordava os automobilistas que ali eram obrigados a parar. Fardados integralmente ou envergando um colete vermelho da Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra, os operacionais facilmente se confundiam com bombeiros e pediam um donativo para a compra de uma ambulância para a corporação local. Esta, porém, nada sabia do que estava a acontecer e nunca recebia qualquer verba.

Se tudo corresse de acordo com o planeado, o grupo abandonava o local na posse da quantia angariada durante várias horas, mas se a GNR ou a PSP fossem alertadas para o falso peditório, a desculpa estava preparada: os burlões diziam que estavam a vender bilhetes para um sorteio promovido pela Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra e devidamente autorizado pelo Ministério da Administração Interna (MAI). Dessa forma, evitavam qualquer problema com a Justiça.

Burla era modo de vida

A investigação, que começou em 2020 e foi conduzida pelo Núcleo de Investigação Criminal de Viseu, suspeita que os responsáveis da Associação Portuguesa de Veteranos de Guerra deram cobertura à burla, recebendo uma percentagem dos lucros obtidos com os falsos peditórios. O último relatório e contas da instituição mostra que, em 2023, esta auferiu mais de 70 mil euros com um “sorteio nacional”, que, no ano anterior, lhe rendera 95 mil euros.

Quem também recebia uma percentagem do dinheiro angariado eram os autores dos falsos peditórios. Muitos deles faziam da burla o seu modo de vida. O restante montante era distribuído pelos elementos de topo da organização, incluindo o líder, que tem residência em Lisboa.

Ao Jornal de Notícias, a GNR confirma que, ontem, foram constituídos como arguidos oito homens, entre os 24 e os 65 anos, mais duas instituições. Todos estão indiciados por burla, branqueamento de capitais e associação criminosa, mas nenhum deles foi detido.

Liga fez queixas às autoridades

O presidente da Liga dos Bombeiros, António Nunes, assegura que há vários anos que são feitas queixas nas autoridades devido a falsos peditórios para associações humanitárias. “São feitos por grupos de pessoas, que se vestem com uma farda vermelha, que se confunde com a dos bombeiros”, para enganar os automobilistas. “Algumas pessoas fazem-no há muito tempo e outras são novas”, diz.

Operação

Fardas apreendidas

A GNR apreendeu ontem dezenas de fardas semelhantes às dos bombeiros e outros bens associados a corporações. Também foram recolhidos extratos de transferências e depósitos bancários, alguns internacionais.

Quase 70 militares
A Operação “The Scheme” foi liderada pelo Núcleo de Investigação Criminal da GNR de Viseu e executada por 68 militares, também dos comandos da GNR de Braga, Leiria e Lisboa. A Direção de Investigação Criminal participou igualmente nas diligências.

Apreensão
27 mil euros foram apreendidos nas 20 buscas em Moimenta da Beira, Braga, Magoito (Sintra), Amadora, Queluz, Agualva-Cacém, Loures e Pombal.
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Nota do editor

Último post da série de 19 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26511: Recortes de imprensa (143): Na Série Especial "A minha Guerra", do Correio da Manhã do passado dia 16, foi publicado um pequeno texto sobre o nosso camarada José Maria Monteiro, ex-Marinheiro Radiotelegrafista (LFP Bellatrix, 1969/71 e Comando Naval da Guiné, 1971/73), que aqui reproduzimos com a devida vénia

Guiné 61/74 - P26651: Notas de leitura (1786): Philip J. Havik, um devotado historiador da Guiné: Na Terra do Novo Deus: O general Henrique Dias de Carvalho na Guiné (1898-1899) (5) – 2 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Abril de 2025:

Queridos amigos,
No virar do século, as autoridades de Lisboa, com os cofres exaustos, e bem mais preocupadas com a ocupação de Angola e Moçambique, não encontravam solução expedita para deletar a presença portuguesa na Guiné, tinha havido o fim da escravatura, a administração limitava-se a algumas praças e presídios e a uma paupérrima capital em Bolama. Surgiram então algumas hipóteses de entregar a colónia a companhias de comércio, é nesse contexto que o Marquês de Liveri convida o general Henrique Dias de Carvalho a ir até à Guiné e emitir um parecer quanto às potencialidades da colónia. O general socorreu-se da documentação mais recente, confiou num conjunto de opiniões sobre as populações da Guiné, há que admitir que a etnografia e a etnologia ainda não tinham dado passos fundamentados, daí ele ter tecido considerações que correspondiam, em muitos casos, a pouca realidade no campo das etnias, quanto aos usos e costumes e até aos espaços ocupados por todas estas populações. Revela-se profundamente otimista quanto ao valor da terra e com uma exaltação contida diz a quem o lê que poderá estar ali um novo Brasil. Estes apontamentos do general Dias de Carvalho têm seguramente o valor histórico de versarem um incitamento ao presumível investidor, que não chegou a ser. Insista-se que em Lisboa não se sabia muito bem o que fazer da Guiné; mas naquele tempo estava em desenvolvimento uma cultura que iria dar os seus frutos: o amendoim.

Um abraço do
Mário



Philip J. Havik, um devotado historiador da Guiné:
Na Terra do Novo Deus:
O general Henrique Dias de Carvalho na Guiné (1898-1899) (5) – 2


Mário Beja Santos

Continuando a leitura deste ensaio de Philip Havik sobre apontamentos do general Dias de Carvalho referentes à sua estadia na Guiné no virar do século, ele vai tecer um acervo de considerações sobre o quadro étnico, viu-se que procurou olhares e considerações de outros viajantes e estudiosos, mas muito do que escreve não era nem exatamente assim nem os números dados e até a leitura etnológica e antropológica carece de rigor. Comentário meu, veja-se o que ele diz de Fulas.

Os Fulas vieram do interior e encontraram já estabelecidos na Guiné os Mandingas e os Biafadas; têm origem em pastores e nómadas que foram avançando no Sudão, em direção ao litoral. O Fula é de cor, vermelho acobreado, lábios delgados, dentes verticais, cabelos lisos que usam entrançados, feições inteligentes, extremidades finas, formas de corpo esbeltas e corpulência mediana. O Fula usa vestuário idêntico ao dos Mandingas, cabaia flutuante, bubu, calção em forma de saco apertado nos joelhos e cintura; usa geralmente sandálias fabricadas pelos Mandingas; os homens ocupam-se apenas dos rebanhos, deixando aos escravos de outras raças o amanho das terras; atualmente no Forreá já se entregam à colheita da borracha. O general, sabe-se lá com base em quê diz que os Fulas tendem a desaparecer por inúmeras miscigenações e doenças venéreas. Dividem-se em Forros e Pretos. Os Fulas-Pretos consideram os Forros uma raça inferior e ocupam a zona mais interessante do Forreá entre Buba e o rio Cogon; juntaram-se estas duas raças para se libertarem do jugo dos Mandingas e dos Biafadas. Os Fulas-Forros têm, como riqueza principal, o gado vacum; reconhecem a soberania dos Almamis de Timbo, chefes supremos do Futa Djalon.

Nos seus apontamentos, Dias de Carvalho destaca os Bijagós, nomeadamente o começo da plantação de amendoim sobretudo em Bolama e nas Galinhas. “A ênfase dada às ilhas na introdução desta cultura demonstra a mesma consciência histórica da sua relevância para a transição do comércio de bens e tráfico de escravos para uma economia de plantação.” Refere a parceria entre governadores e negociantes da época, procurou nos Bijagós obter uma concessão para o Marquês de Liveri, procurava-se estabelecer uma feitoria agrícola e comercial na ilha de Orango.

Revelou interesse pelo feiticismo, deu o exemplo de um curioso fenómeno a que assistiu, tratava-se da chegada do Deus Branco à Guiné, percorreu vários chãos em 1898 e depois desvaneceu-se. A passagem deste Deus Branco serviu-lhe para ilustrar a natureza supersticiosa das sociedades africanas.

Bem importante são as conclusões que Havik estabelece para a leitura dos apontamentos de Dias de Carvalho:
“Até aos anos 90 de oitocentos, a Guiné, que é na altura composta por aproximadamente 70 km2 de algumas ‘tiras de terra’, aparece como uma colónia fantasma, por causa da falta de soberania efetiva portuguesa sobre o território dentro das fronteiras delineadas no tratado com a França em 1886. Quando da chegada de Dias de Carvalho à Guiné, o poder sobre a maior parte da colónia ainda é exercido pelos povos nativos, que só cederam perante intensas campanhas militares na parte continental do território em 1915.
O Ultimatum Britânico fez com que a Coroa, novamente, apostou nas colónias para resgatar a metrópole da crise financeira e económica em que se encontrava. Para tal, facultou grandes concessões a companhias estrangeiras e portuguesas para facilitar a exploração agrícola e comercial da Guiné, e valorizar os seus recursos naturais e humanos. Começando com a concessão dos ‘terrenos públicos baldios’ aos Condes Buttler em 1892 e dos ‘terrenos incultos ou desocupados’ ao Mateus Augusto Ribeiro de Sampaio e o Conde Valle Flôr em 1894, que essencialmente incluíram a maior parte do então distrito, a Guiné ornou-se um alvo apetecível para a ‘exploração agrícola, comercial e industrial’.
A constituição da Companhia de Comércio e de Exploração da Guiné, criada nos anos 90 de oitocentos para mais tarde ser comprada por capitais belgas e que Dias de Carvalho é convidado integrar, visava também obter através de compra terrenos para desenvolver a agricultura de renda na Guiné. Esta política das grandes concessões a companhias estrangeiras não era, no entanto, nada pacífica entre os demais ponteiros e comerciantes no território, que protestaram veementemente contra a concessão que por incluir a maior parte dos terrenos férteis no litoral, era vista como um ameaça.”


As casas de comércio estrangeiras eram o sustentáculo da província, o único comerciante de origem portuguesa era António da Silva Gouveia, a Casa Gouveia, mais tarde integrada na CUF. O pequeno comércio era dominado por cabo-verdianos. Vê-se que é um observador sem ilusões da nossa ténue presença, cita mesmo um dos governadores da Guiné quando realça que “é vergonha confessar que desde séculos a nossa ação se não estende além dos muros que circundam a povoação de Bissau”. Havik recorda que foi precisamente na década e meia imediatamente anterior à chegada de Dias de Carvalho à Guiné que os governantes começaram a olhar para a maneira como se podia tirar proveito dos seus amplos recursos naturais. Não surpreende, pois, que estivesse centrado nos seus relatórios enviados a Lisboa sobre o que a terra da Guiné podia dar, como podia ser ocupada e valorizada. Adverte que era preciso aumentar a força militar para que houvesse uma boa administração, ou seja, impunha-se a tropa para garantir ocupação, e é bastante auspicioso do que o solo guineense poderá dar. Num arrobo contido, fala mesmo da Guiné como o novo Brasil. E é bastante temperado, no fundo comprova o seu tato político, ao fazer duras críticas e observações impiedosas à administração colonial e à gestão dos recursos pelos colonos e comerciantes, equilibrando nas suas apreciações ao dar uma vibrante cor local e despertar a atenção de quem o lê para a chamada Babel Negra, os tais apontamentos que provavelmente considerava fiéis sobre etnografia e etnologia, o que comprovadamente não era verdade.

Igreja de Nossa Senhora da Natividade, Cacheu. Constitui a primeira igreja portuguesa erigida na costa ocidental africana.
Azulejos de Bissau
Pormenor do rio Cacheu
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Notas do editor:

Vd. post de 28 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26626: Notas de leitura (1784): Philip J. Havik, um devotado historiador da Guiné: Na Terra do Novo Deus: O general Henrique Dias de Carvalho na Guiné (1898-1899) (5) – 1 (Mário Beja Santos)

Último post da série de 31 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26632: Notas de leitura (1785): "Futuros Criativos"; edição da Associação para a Cooperação Entre os Povos, Fundação Portugal-África e Instituto Camões, 2019 (2) (Mário Beja Santos)